terça-feira, julho 9

O grande dia

Para ler ouvindo: 
Hozier - Take me to church
James Taylor - How sweet it is
Fleetwood Mac - Dreams


                                                ~ . ~ . ~. ~



Acordei mais cansada do que achava que fosse possível. Mal consegui abrir meus olhos devido a luz da manhã me cegar temporariamente.
Estranhei ao procurar pelo corpo dele na cama tão grande e não encontrá-lo. “Quanto tempo faz que não dormimos separados?” pensei.
Por alguns segundos me assustei ao ver o local no qual despertei. Quando me dei conta de onde estava, a ansiedade tomou conta de mim completamente: eu estava no quarto do hotel no qual será realizada minha cerimônia de casamento.
Confesso que depois da descarga de adrenalina, só conseguia me perguntar se alguém recebeu as flores que faltavam, mas para isso existia a maravilhosa Isabella, minha melhor amiga e madrinha. Ela havia me mandado uma mensagem há 10 minutos:

[Isa, às 06:54] Bom dia, noivinha linda! Vamos despertar? Estou providenciando o local certo das flores e passo para te buscar daqui a 15 minutos, ok?

Olhei no relógio e confirmei que ainda faltavam 5 minutos para ela chegar. Cinco preciosos minutos era tudo o que eu precisava. Estava me sentindo exausta nesses últimos dias.
Eu sei que o bendito sonho da cerimônia de casamento era meu, mas não sabia que daria tanto trabalho realizar um sonho assim… Passamos os últimos 8 meses completamente absorvidos neste assunto. Tudo à nossa volta girava em torno de 13 de junho de 2020. Um desgaste financeiro, psicológico, familiar e etílico podemos dizer assim. Tudo passou na minha cabeça como um filme e eu só conseguia estar aliviada por ter chegado este dia.

Isabella entrou no quarto dando batidinhas na porta. Ela, sempre tão delicada, aceitou imediatamente o nosso convite para ser madrinha. É com ela (e toda experiência que possui) que contei todo esse tempo para fazer dar certo o tal do grande dia.

   - Já acordou, bela adormecida?
   - A bela é você, a adormecida sou eu mesma!
   - Acordamos de bom humor, princesa? Toma, trouxe café.

Pulei da cama, agradecendo a minha amiga por ter trazido minha bebida favorita. Os três primeiros goles foram totalmente relaxantes, mas não demorei para lembrar que eu iria precisar resolver muitas coisas antes de me encontrar com Isaac no altar.
Das flores, a Isa tinha cuidado. Precisava então ver as madrinhas, as crianças, o buffet e se o atrapalhado do Rafael tinha trazido o terno do meu marido. Quer dizer, futuro marido.

Ah, quando penso nele… Não no Rafael, claro. No Isaac, meu noivo e daqui a algumas horas o meu marido…

Abri as cortinas do quarto e percebi que o dia estava lindo. O céu estava azul, um tempo maravilhoso para celebrar um casamento na praia durante o dia, justamente como eu queria. Foi inevitável não lembrar do dia em que Isaac e eu nos conhecemos. Esse mesmo céu, essa mesma brisa marítima invadia meus pulmões naquele dia. Como foi mesmo que eu fui parar naquela praia?
Ah sim, lembrei. A minha colega Day e eu viajamos a trabalho para Maceió no outono daquele ano. Combinamos de ir correr na praia, mas ela me deu um belo de um bolo. Eu, me sentindo super independente, fui correr sozinha. Depois do exercício, parei para tomar uma água de coco sentada na areia. Foi ali, naquela praia tão perto de onde estamos agora, que o dono do olhar mais lindo que eu já vi na minha vida apareceu. Fizemos contato visual algumas vezes, ao passo que ele vinha caminhando na minha direção. A minha vida amorosa tinha sido um completo desastre até então, eu não estava nem um pouco afim de flertar com um doido vindo na minha direção naquela hora, mesmo que esse doido fosse realmente bem bonito. Minha prepotência e orgulho deram lugar ao susto e a um gritinho de medo, quando ele me disse que eu estava sentada quase que em cima de um caranguejo que ele queria pegar. Eu dei um pulo. Ele deu uma risada. Pronto. Não precisou de mais nada para eu passar o resto da tarde ajudando Isaac a catar caranguejos na praia enquanto a nossa afinidade se revelou e o destino se encaminhou de resolver o resto da nossa história.

Isa me desperta das minhas lembranças trazendo a Cecília e o Guilherme, seus filhos com Daniel, hoje, meus pajens.

      - Tia, a mamãe não quer me deixar comer bolinhos no café da manhã, mas hoje eu posso tudo, não é? - resmungou manhosa a caçula Cecília pulando no meu colo.
     - Claro, meu amor! Hoje o dia é mais que especial e não quero ninguém triste no meu casamento, certo? - Isabella me olha de cara feia. Faço sinal de “deixa só um pouquinho, vai?” e minha amiga me olha sem se comover.
    - Por que você não chama sua tia para tomar café da manhã com vocês enquanto eu ligo para o cabeleireiro? - disse Isa nos dando uma trégua.
   - O último que chegar na mesa não vai comer bolinhos! - disse Guilherme correndo para fora do quarto.
   - Ei, espere a gente!
   - Esse menino puxou o Daniel todinho, não é, amiga? - retruquei sendo puxada pela caçula às pressas.

Descemos para a área do café da manhã e tive de me certificar umas oito vezes que o Isaac não ia aparecer por ali. O máximo que aconteceu foi eu ter esbarrado com o Rafa, oportunidade perfeita pra perguntar pelo terno, o que ele me jurou que já estava no quarto do noivo - que, por sinal, ainda dormia.
Vi o cabeleireiro chegando na recepção do hotel com toda sua parafernalha. Senti um pequeno arrepio ao longo da coluna. Eu mesma fui recebê-lo e encaminhar a equipe que lhe acompanhava ao espaço destinado a arrumar as crianças e as madrinhas.

   - Nada disso querida, não vou começar pelas crianças ou meu trabalho estará todo perdido na hora da cerimônia. E nós não queremos isso, certo? - Eu apenas balancei a cabeça negativamente.
   - Ótimo! Vamos cuidar das madrinhas primeiro. Cherry, my honey, traga minha maleta até aqui, temos muito trabalho hoje.

Subi pelo elevador pensando em reunir pelo menos cinco das seis madrinhas para adiantar maquiagem, cabelo e tudo que for necessário para que aquele cabeleireiro não viesse atrás de mim por um bom tempo. Quando cheguei no andar, para minha surpresa, encontrei quatro delas rindo no corredor. Todas foram me cumprimentar muito animadas, me fazendo corar. Anunciei que o profissional já as aguardava e no mesmo instante me deixaram para trás disputando para ver quem seria a primeira na transformação da produção.

Escolher as madrinhas e os padrinhos foi muito fácil, na verdade. Pensava nisso enquanto caminhava com as crianças para deixá-las com a Isa. O melhor amigo de Isaac é o Daniel, casado com a Isa e pai de dois filhos, como eu disse. Outros dois grandes amigos, Rafael e Thiago, estão noivos da Paulinha e da Bia, respectivamente. Os amigos de infância, Cristiano e Lucas, estão namorando há séculos. Até aí, temos os casais certinhos para nos apadrinhar. Só o amigo do trabalho do Isaac, Pedro, estava solteiro (e sem a menor previsão para casar, aquele safadinho). Pedimos que ele acompanhasse minha cunhada para que ambos fizessem par. Espero que a Marina se dê bem com ele e não se iluda com a beleza do Pedrinho, por Deus, não quero um problema dessa magnitude logo depois deste casamento.

As crianças estavam bem alimentadas do café e logo correram para a mãe, cheios de animação, pedindo permissão para ir brincar no parquinho. A incrível Isabella já tinha providenciado meu vestido, recebido as flores e ligado para a cerimonialista. Insisti para que ela ficasse um pouco com os filhos no parque enquanto eu me certificava dos detalhes com o DJ e a banda ali perto.

Minha cunhada apareceu para me ajudar e resolvemos tudo muito rápido. Eu estava realmente nervosa, mas todo o meu trabalho nas semanas anteriores estavam dando resultado para que tudo estivesse no jeito certo para hoje.

Repassei com a cerimonialista os casais de padrinhos. Enquanto tomo nota mental de livrar a Marina de bebida alcoólica para que ela não caia na lábia do Pedro, lembramos de como nos conhecemos. Ela disse que sempre imaginou que o Isaac fosse apresentar a futura esposa dele para a família num jantar super formal. Pois é, eu também. Acontece que quando nos envolvemos com uma pessoa da maneira como Isaac e eu nos envolvemos não dava para saber logo de cara que iríamos dividir o resto das nossas vidas juntos.

   - Até hoje é difícil imaginar que iríamos nos conhecer logo naquele hospital, hein? - relembrou aos risos a minha cunhada.
   - Se seus pais não te levam no hospital a tempo, você podia ter morrido, Marina! - respondo séria.

Eu amo a minha profissão. Atualmente sou pediatra, mas conheci a família do meu namorado quando trabalhava na emergência geral da Santa Casa de Misericórdia. Por sorte, pude eu mesma dar os vinte pontos na cabeça de Marina enquanto Isaac explicava aos seus pais que a filha deles estava sendo bem cuidada pela médica que ele pretendia apresentar como sua namorada. Claro que depois veio mesmo um almoço formal para me “introduzir” na família, mas a essa altura, para minha sorte, já tinha sido recebida como uma filha pelos meus sogros.

Está tudo pronto lá fora. O juiz de paz deve chegar em alguns minutos. A cerimônia será apenas no civil, pois Isaac é ateu e eu também não escolhi uma religião exatamente.
Subo para ver se as madrinhas já estão arrumadas. Uma mais linda que a outra. Quero sair dali para não chorar de emoção. Olho o relógio do celular. “Preciso correr, senão o atraso vai ser por conta da noiva”, penso subindo depressa as escadas do hotel. Logo minha pressa foi interrompida. Quase perdi o fôlego quando ouvi a voz do Isaac descendo as escadas.

   - Claro que estou calmo, Dan. Por que estaria nervoso?
   - Porque hoje é o seu casamento? - respondeu um Daniel irônico.
   - Exatamente. Hoje vou formalizar a união com a mulher da minha vida. Sabe a importância disso?
   - Há treze anos sei disso, meu caro amigo, por isso estou te achando calmo demais para alguém na sua posição.
   - Sr. Daniel, só porque eu precisei te forçar a beber dois shots de tequila antes de você entrar na igreja para se casar com a Isa isso não significa que hoje é seu dia de vingança, ok? Acredite em mim, eu sei o que estou fazendo.
   - É mesmo? E o que você está fazendo, senhor “confie em mim”?
   - Estou dizendo sim para minha felicidade ao lado da pessoa mais incrível que eu já conheci em toda a minha vida.

Não consigo evitar as lágrimas nessa hora. É com este homem que eu vou casar? Ah meu deus, não imaginava ele dizendo algo tão amoroso assim… Tento conter as lágrimas enquanto penso num jeito de fugir dali para que eles não me vejam.

- Colocou isso nos seus votos? Ficou bom, hein! - retrucou Daniel.
- Ih, cara, os votos! Volta, precisamos voltar no quarto eu esqueci completamente dos votos!
- O quê? Você está todo apaixonadinho e esquece logo essa parte?
- A Beta pegou no meu pé pelo terno, pelo sapato, até pelo perfume, mas como ela não me cobrou os votos eu simplesmente esqueci!
- Você vai ser um marido imprestável. - Daniel ria sem parar.

Eu não sabia se queria ficar viúva antes de casar e matar o sr. Isaac Bugarim antes da cerimônia ali mesmo ou se estava agradecida pelo seu deslize que me ajudou a chegar no meu quarto sem ser vista por ninguém.
Não consegui evitar ficar pensando no que ele colocaria nos votos. Eu sou muito tímida, preparei poucas frases, todas clichês. Mas ele gostava de escrever - mais do que de falar. Meu noivo não é de demonstrar sentimentos, apenas quando é preciso. Mais um motivo para me deixar ansiosa pelo quê ele iria falar quando chegasse a hora.

   - Cherry, chegou a hora da diva! Vamos, vamos. - disse o cabeleireiro batendo palminhas ao tomar conta do quarto que eu ocupava.

Pedi uma maquiagem discreta e fui atendida. Paulinha disse que era melhor eu escolher uma make mais forte, mas Bia opinou a meu favor. Quando eu entrei no vestido branco, rendado e cheio de brilho, todas que estavam ali se emocionaram.

- Nada de estragar meu trabalho, noiva! Pensa na escalação da Copa de 2006, nas coxas daqueles jogadores maravilhosos que rapidinho essas lágrimas secam, baby! Adriano, Roberto Carlos, Kaká … ai ai… escolhe um aí pra você lembrar antes do “sim”, vai.

Todas caímos na risada dissipando os ares emocionados, mas eu só conseguia pensar em quantos anos tinha esse cabeleireiro para citar a seleção de 2006 com naturalidade desse jeito.

Deve ter sido um desses motivos pelos quais Isaac se apaixonou por mim. Eu sempre pensava porque ele se interessou logo por uma pessoa como eu. Eu tinha essa capacidade de pensar em coisas que podem parecer óbvias para os outros, mas que sempre cabiam numa pergunta. Por um bom tempo, Isaac tentou me responder tudo que sabia, e eu estou certa em afirmar que a inteligência daquele ser humano não tem fim porque, na maioria das vezes, engatávamos uma conversa tão intensa quanto nossos sentimentos um pelo outro.

Olhei-me no espelho uma última vez. Era isso. Tudo que eu sonhei estava ali diante dos meus olhos e a menos de 100 metros numa praia paradisíaca de Alagoas. Todo esforço pela cerimônia, todo aperto econômico que fizemos… Toda minha paixão, todo meu amor por aquela pessoa, sobre como eu sou melhor ao lado dele… Tudo estava simbolizado ali, naquela fração de segundos.

Respirei fundo. Virei-me para a porta. Saí daquele quarto pronta para receber no matrimônio o amor da minha vida.

Isaac Bugarim, serei sua para sempre.



*

sexta-feira, agosto 3

Querido diário,

faz mais de ano que eu não venho aqui deixar registrado tudo que aconteceu na minha vida.
Mas você vai ficar feliz em saber o porquê (será que eu ainda sei escrever "porquê"?).


Ele veio. De vez.
Aham. Pode acreditar.
Chegou em janeiro do ano passado. As gatas o receberam bem, com vários arranhões, como é de se esperar afeto de felino.
Comemoramos muitas datas felizes até agora: aniversários, natal, ano novo, um ano, quatro anos e 10 meses do Téo.
O Teo? É o felino que acrescentou o time masculino. Desde que ele chegou, as coisas precisavam se equilibrar, entende? E éramos 3 meninas. Ele tava em minoria. Daí o Teo não podia ter escolhido parceiro melhor (é parceiro ou puxa-saco que chama? Quando se trata de gato nem sei como chamar...)
Eu mencionei um clube pra você? É um clube de leitura! Chá das 6 p.m.
Mas ó, nem se anime, o clube tá mais pra lá do que pra cá... Duas "membras" não estão mais morando em Brasília. Se bem que, deixa eu te iludir um pouco, a gente tá tentando voltar... Se a gente conseguir antes da próxima vez que eu escrever aqui, te conto.
Também teve aquele lance complicado com minha mãe... Ainda não acabou. Quem sabe quando tiver um fim finalesco eu me inspire pra te contar tudo tudinho? Por ora, fique só com a certeza de que está tudo bem. Mesmo. Preocupa não.

Tá vendo quanta coisa?
É preciso viver, diário, senão não tenho o que contar para você depois...

Confesso que penso em você com frequência. As vezes não me acho capaz de te contar tudo que se passa aqui dentro (a terapia vai bem, obrigada). As vezes, antes de dormir, rascunho mentalmente palavras que são só pra você. Daí caio no sono e nada se concretiza.

A melhor parte é saber da sua fidelidade: você está sempre aqui pra permitir que eu me expresse sobre qualquer coisa. Sobre aniversários, gatos e mitologia.

Falar em aniversário, quer saber quantos anos eu tenho? 30!
Não, a gente não tá morando em São Paulo com um pug. Nossa realidade está completamente oposta a isso.

Aliás, acho que é isso, diário, o que eu tô tentando dizer pra nós. Não é que eu não tenha tido vontade de estar aqui: é que eu tava preenchendo minha vida com amor de verdade.

segunda-feira, dezembro 12

A menina do palito

Eu estava na sétima série do ensino fundamental. Era uma garota tímida, mas que tinha bom relacionamento com todos os colegas do colégio, apesar de não fazer parte de nenhum grupinho. E tinha essa garota. Ela desenvolveu um corpo de mulher muito rápido. Peitão, bundão e cinturinha fina. Muitas garotas não tinham nem saído das fraldas direito e a Taís já tinha cara de modelo da capa da playboy. Tudo bem por mim, ela era legal. Mas pras outras meninas, ela era uma puta (é isso que dá ser adolescente. Se você não pode ser o centro das atenções, é guerra!).
Daí teve um dia na aula de educação física. Aquele dia que você acha que nunca vai acontecer com você.

Eu não estava nem um pouco afim de fazer a aula. Eram dois horários com as meninas de duas turmas. Jogando handebol. Isso significa bolada na minha cara com certeza.
Inventei uma desculpa qualquer pro professor, mostrei minha mão "imobilizada" (enfaixei igual a minha cara) e ele me mandou esperar na arquibancada. Legal. Duas horas olhando as cavalas da minha turma perderem pras brutamontes da turma "D".
Fiquei entediada e fui conversar com as outras meninas que estavam esperando pra jogar. Eis que avisto Taís ali meio avulsa, tentando se enturmar, coitada. Quando cheguei, ela quis mexer nos meus longos cabelos e fazer um penteado super legal com o palito de madeira que eu tava usando. Sim, porque depois de gastar todo meu tempo "enfaixando" minha mão eu não conseguia prender o cabelo, saí apressada e a única coisa que encaixou de primeira foi o palito de madeira (estilo o que as japonesas usam para fazer aquele coque de gueixa, sabe?).
Mexe cabelo dali, mexe cabelo de lá. Pronto. Taís achou um penteado e prendeu com o palito. Lá tava eu com o cabelo desgrenhado no meio do ginásio indo sentar de novo na arquibancada. Taís foi treinar saques e manchetes de vôlei com outra colega (isso porque a aula era de handebol - e as outras alunas lá, se matando no meio da quadra). 
De repente, não mais que de repente, Taís mandou uma mega manchetona que a bola de vôlei foi parar no teto do ginásio e caiu.... na minha cabeça. Pois é. O ginásio era imenso, a porra da bola foi no teto da parada e achou de cair aonde? aonde? sim, na minha cabecinha linda. Até então eu só senti a pancada na cabeça. Xinguei internamente, as meninas riram porque mesmo sem estar jogando eu levei uma super bolada como de costume, e tudo bem.
Tudo bem por dois minutos só.
O palito de madeira que Taís prendeu no meu cabelo estava na posição vertical. E a bolada que Taís mandou, sem querer, na minha cabeça, teve uma força suficiente pra fazer o palito perfurar o meu pescoço. Bem ali no final do couro cabeludo, entre onde acaba o cabelo e fica a pele da nuca.
Pois é. Dois minutos depois da bolada eu comecei a sentir um ardor no pescoço, já na parte final da nuca, começo da coluna. Chamei Cascia, minha amiga, e pedi pra que ela visse se tinha algum bicho me picando nas costas. Ela não viu bicho nenhum e o ardor começou a ficar mais intenso, parecia uma bola de fogo queimando toda a minha coluna. Foi me dando uma agonia, eu não sabia se chorava, se gritava, até que Cascia disse "peraí, vamos tirar esse cabelo todo aqui da nuca pra eu olhar melhor". Quando ela tentou tirar o palito, ela não conseguiu. Fez força, e o palito não saiu. Eu passei a mão na minha nuca, fiz toda a força do mundo, e o bendito do palito não saiu, tava lá, fincado na minha nuca. Em momentos de verdadeiro pânico eu não sei reagir. Sou o tipo de pessoa que fica relembrando mentalmente cenas que se passaram e tentando remontar todo o diálogo que eu poderia ter tido, se não fosse a minha timidez, falta de reação, ou sei lá o quê. O fato é que eu me lembro claramente o que aconteceu depois. E nenhuma cena que eu relembre desse dia podia ter alteração.
Cascia, diante do palito preso na minha nuca, gritou pra todo o ginásio "TEM UM PAU NA CABEÇA DA ROBERTA!"
Como, em sã consciência, a pessoa me grita que tem um pau na minha cabeça? eu tive que rir porque não sabia da gravidade da situação e só me restou ficar ali enquanto todas as meninas - as cavalas, as brutamontes e as minhas amigas - correram pra ver o tal do pau fincado na minha cabeça. Ôh gente! Eu congelei numa posição só. Fiquei com as costas abaixadas, parecendo japonês cumprimentando alguém. Daí eu só vi os pés da professora de educação física correndo pra me acudir. Eu gritava "tira esse palito da minha cabeça! tira!" e ela tentou meio que fazer um exorcismo pra parada sair. AveMariaCheiadeGraaaaaaaaaaaaça (*tentando puxar o palito*). E nada da porcaria se mexer.
Chamaram o tio da cantina, um homem cinquentão, magro, franzino, que usava calça social e camisa pólo. Ele calado, fez uma força homérica e PÁ, puxou o palito. Como você, amiga inteligente, pôde deduzir até agora, em uma situação assim, NÃO puxe o palito! Mesmo que a pessoa esteja gritando de dor, a providência é levar pro hospital e lá ser feita a remoção.
Pois bem, Já que tinham conseguido tirar o palito, foram me levar pro hospital.
No caminho pro carro da diretora, eu vi todos os rostos das colegas de classe: umas chorando, outras assustadas, ninguém filmando pq não tinha celular pra adolescente naquele tempo haha, Taís pedindo desculpa sem parar e a que mais me marcou, a Mariana "Medusa" chorando me dizendo "Robertinha, se algo acontecer com vc, a gente vai pegar a Taís de porrada vei!" e eu respondendo "tá bom vei!".
Bom, nada de porrada. Nada de nada mesmo. Fiquei bem. Minha mãe quase me mata quando soube que eu quase morri. O ortopedista de plantão fez uma ressonância e viu que o palito perfurou apenas meu músculo. Faltaram dois milímetros pra atingir minha coluna cervical. Dois milímetros me salvaram de estar tetraplégica ou paralítica. Acho que Deus tem um plano na minha vida. Só isso explica porque eu não tô numa cadeira de rodas hoje. Meu anjo da guarda deve ter recebido um bônus pra me salvar dessa.

Bom, a volta pra casa e pro colégio foram complicadas.
Taís me ligou chorando achando que a culpa era toda dela. Eu sabia que tinha sido um acidente. Foi idiotice dela colocar o palito na vertical. Foi estupidez minha estar num ginásio com um palito. Desculpei a garota. Mas nunca mais nos falamos direito. Ela mudou de turno e mesmo assim continuou rejeitada. Além de puta era quase assassina também. Não devia ser fácil estar na pele dela. Ela fez terapia até o terceiro ano ou mais. Hoje está casada, tem dois filhos e acredito que sua filhinha não usa palito de madeira. 
E eu? Bem, eu fui o centro das atenções do colégio. Pelo menos por uma semana. Usei um colar cervical por longos 45 dias. No começo todo mundo sentia peninha de mim. Professores me paravam no meio do corredor, ou me chamavam pra entrar numa sala de aula pra perguntar "quantos pontos você levou? 35 ou 43?" Ficavam decepcionados quando eu dizia "apenas um ponto pra fechar o furo que o palito fez na pele, mas, veja, foram duas anestesias, olha que coisa!". Meu crush na época me ajudou a carregar meus materiais e sempre pegava água pra mim. Foi a coisa mais romântica que alguém já fez por mim na sétima série. Ah, agora o colégio tem uma regra inflexível de não poder entrar no ginásio, nem fazer aulas de educação física usando palito ou objetos pontiagudos em qualquer lugar do corpo. Tudo por causa da "menina do palito".

Por fim, um detalhe curioso. Eu não lembrava de como tinha sido a história entre o momento em que levei a bolada e o momento em que o tio da cantina arrancou o palito do meu pescoço. Eu lembrei só depois que me contaram a história pela milésima vez. Foi mesmo uma deslembrança... Agora é a lembrança que guardo e que me dá a certeza de que ninguém sai intacto do colégio. Literalmente.


quinta-feira, agosto 25

Madrugada a dois

A madrugada vem sorrateira outra vez.
E, com ela, o desejo de vê-lo outra vez.
Em outros tempos, pra mim, a madrugada era o lugar do perigo, da adrenalina, de respirar aquele ar frio combustível de pensamentos completamente insanos e perfeitos, que nunca serão ditos em voz alta durante o dia.
Em tempos ainda mais remotos, a madrugada era simplesmente o lugar de descanso, de repouso, de paz, de dormir. Como diria Nêisinha, Deus criou a noite pros seus filhos dormirem: Ele apaga a luz, a gente ora e fecha os olhos. E dorme.
Mas como eu poderia fazer isso?
Nos tempos de agora a madrugada é tudo isso junto e muito mais. Fecho os olhos, respiro o ar frio. Abro os olhos, vejo as estrelas lá no céu. O céu não está apagado, pelo contrário. Tem uma lua bem cheia, enorme, iluminando meus pensamentos.
Quase todos eles são sobre lembranças...
Lembranças de madrugadas sorrateiras como a de hoje. Momentos em que a artimanha de viver é mero prazer. Liberdade. Desejo.
Por que ele não chega logo?
Ah! Finalmente! Ouvi o barulho da porta do banheiro se abrindo. Posso dar uma última espreguiçada? Dá tempo?
Pulo e me jogo na cama de qualquer jeito. O lençol é minha testemunha de que estou sonolenta, mas denuncia minha vontade de ficar acordada e satisfazer esse frio (na barriga).
Ele nem me nota.
Passa por mim com o hálito de pasta de dente, fragrância de desodorante, cabelo lavado com xampu de aloe e vera e roupa impregnada de amaciante. A madrugada é assim, safada, aguça meu olfato e tudo que consigo sentir é um cheiro de homem se aproximando de mim.
Ele fecha a janela. Acabou minha lua cheia, queimaram todas as estrelas. Só sobramos eu e o lençol. E os pensamentos torpes que não me deixam dormir.
Ele passa por mim de novo. Lança um olhar meio de lado, desenganando minha perfeição, esboça um sorriso como quem diz "eu sei que você tá lutando contra o sono. Venho já te fazer dormir".
Com toda a autoridade que me é dada por esse sorriso, eu me aninho na cama, ergo uma sobrancelha, os olhos quase se fechando e o perigo chegando. Dessa vez eu consigo!
Sigo cada movimento dele com o olho esquerdo, o da visão boa.
Ele digita alguma coisa no teclado do celular. Acho que programou o despertador pra sete e meia. Droga. Xingo mentalmente o compromisso das oito e quarenta e cinco enquanto ele aperta o atualizar de alguma rede social.
O clique no botão de travar o aparelho me desperta da minha indignação mesquinha.
Não consigo evitar um sorriso no canto da boca. Dou conta de inspirar pela última vez. Hoje eu consigo!
A madrugada é assim, sórdida, aguça minha audição. Sei que ele está passando a mão pelo corpo cheiroso. Reviro os olhos, me cubro com meu cúmplice e aguardo meus sentidos apontarem a hora certa do encontro dos pensamentos insanos com o momento perfeito.
Ele, de costas pra cama, se despe. A bermuda cai no chão e revela tudo que eu queria ver. Consegui. Tenho exatamente um segundo até ele apagar a luz do quarto. Ele é cruel e sabe disso. Ele desliga tudo.
Acabou minha luz, queimaram todas as lâmpadas. Só sobramos eu e ele. E a lembrança devassa que vai me fazer dormir.
Quando a madrugada vem sorrateira, não resisto. Entrego-me livre aos meus desejos. Ele demora a me satisfazer, já que eu não sei esperar.
Ele se deita, me oferece seu colo gentil. Meu tato, safado, percorre tudo que acabei de ver. Tá tudo ali. É tudo nosso. Ele espirra. E funga. E eu finjo que não percebi, até ele se acomodar de novo.
- Vamos dormir?
- Aham.
- Tá com sono?
- Tô.
- Lembrei de apagar a luz depois. Eu sei que você gosta.
- Hã? Não faço ideia do que você esteja falando. Boa noite.
- (risos) Boa noite, amor.

Madrugada safada. Sorrateira e safada.



segunda-feira, agosto 1

Nêisinha

Esses dias eu tava me perguntando: quantas mulheres negras não largaram seus próprios filhos para criar o filho de outras mulheres (muitas delas brancas)?
Não é sobre racismo, não é isso. Também não pensei na segregação social assim de cara.
Imaginei uma coisa meio freudiana achando que uma das explicações pro preconceito do estigma do criminoso ser "preto e pobre" seria exatamente uma mãe negra e pobre que ao sair para trabalhar entrega seu filho a alguma vizinha conhecida muito bem intencionada e pouco quase nada mãe (no meu pensamento sempre tem uma vizinha ou amiga pra ajudar).

Foi aí que eu me lembrei de quantas negras passaram pela minha vida durante a infância e começo de adolescência. Quantas foram minhas "mães" e me educaram. A mais especial foi a Marinês. A Nêisinha.
"Avise a dona Carmen que sou preta, pobre e evangélica".
Minha mãe, branca, divorciada, nordestina, sofrida, forte e rígida, precisava emendar um plantão atrás do outro e não tinha nem vizinha, nem amiga. Tinha dois diamantes brutos, uma de 11 anos e um de 6 pra lapidar.

Marinês chegou tão tímida. Tímida ficou. Cantava os hinos do Senhor enquanto lavava louça. Tinha uma voz de anjo. De anjo negro, que são os que cantam mais bonito.
Não mandava. Mas a gente obedecia. "Robertinha, você já viu a hora? Quer tomar banho agora ou almoçar primeiro?"

Quando eu chegava da escola sempre tinha café quentinho. E pão. Nêisinha sempre fazia uma oração silenciosa e breve antes de comer. De certo agradecia a Deus pelo alimento. Eu nunca acompanhava a reza. Mas esperava ela abrir os olhos pra dar a mordida no pão, que era pra não atrapalhar Deus a ouvir a prece.

"Boa noite, Marinês!" ela fechava a porta do quarto e eu via pela fresta a sombra de uma mulher pequena ajoelhada com um livro aberto. Não demorava muito e casa toda ficava escura.

Com o tempo aprendi a ouvir muitas das histórias que ela tinha pra contar. Aprendi que é bom tomar sol de manhã por que tem vitamina D. Em três dias sabia o Salmo 23 de cor e salteado. Nêisinha aprendeu comigo a contar até doze em inglês. Nunca tinha visto uma maranhense falando "twelve". Ela aprendeu tão ligeiro que eu pude até ensinar como dizer as horas.
Com ela eu aprendi a não olhar mais as horas. Gravei o cheiro das flores do jardim. Entendi que pecado é o que a consciência acusa. Que Deus ampara e acolhe os que precisam. Exatamente como a gente deve fazer com o próximo. Que o Diabo não tem culpa de tudo, mas está sempre à espreita. Que a gente deve se proteger e não julgar. Tava graduada em religião agora.

"Nêisinha, não se inquiete como sua prima Ceiça. Ela não confia em Deus. Você me ensinou que devemos esperar nEle. Eu tenho certeza de que o seu marido vai chegar".
Nem eu sei de onde eu tirava essas coisas.

Virei modelo do jardim. Ela queria uma foto dos diamantinhos. Eu no meio das bonecas. Eu no jardim. Eu no quintal. Eu pequena. Eu grande. Só ela pra me arrancar pose de todo jeito. Só pra ela eu sorri como criança. Só eu criança podia esquecer de pedir pra ela sair na foto também.

Nêisinha me ensinou que sofrer bullying faz parte da vida. Que ser zoada é muito engraçado, quando você aprende a rir de si mesmo. Eu parecia mesmo a caipirinha do Tio Du na festa junina. E eu tava linda com minhas bochechas tão rosadas.

"Marinês, hoje tem frango. Fica pra comer com a gente?". Nêisinha tinha um amor muito grande aos domingos. Eu também. O dela era a igreja. O meu, era almoçar com minha mãe. Dona Carmen sempre cozinhava um monte de coisa gostosa. E sempre tinha sobremesa. Marinês foi desaparecendo do momento da sobremesa e até dos almoços de domingo. Um belo dia, ela abraçou o amor pela igreja de vez.

Alguns anos depois ela entrou em contato conosco. Veio passar o aniversário de 14 anos do diamantinho irmão com a gente. "Roberta, você tinha razão. O Senhor mandou meu marido". E eu me lembrava que eu tinha dito isso? Nem ela lembrava como dizia doze em inglês. Empatou.
Nunca mais vi foto. As fotos do aniversário queimaram. Nem prestou pra revelar.

Ela se tornou pastora de uma comunidade pobre. Tenho notícia do trabalho de caridade que ela faz. Ajuda muita gente. É ajudada. Não sei se teve filhos. Abortou alguns no começo do casamento. Espontâneo. Sofrido. Não sei se ela tem vizinha ou amigas quase mães pra deixar os diamantinhos dela.

E eu? Bom, eu continuo amando os almoços de domingo. Agora sou eu que lavo a louça cantando. E mudei de religião. Ainda sei o Salmo 23 de cor. Conheço o cheiro das flores. Não poso mais pra foto. Nunca mais ensinei ninguém a falar inglês. Aprendi a me proteger e não julgar.


terça-feira, junho 28

Enxaqueca

Prezada/o amiga/o,

padeço de uma doença chamada enxaqueca crônica (CID 10 - G43).
Caso você me encontre em um dia em que eu esteja "atacada", favor siga as instruções abaixo:

1 - Não me pergunte se eu já tomei remédio.
Provavelmente eu já tomei e estou aguardando o efeito.

2 - Não me receite remédios. Nem caseiros.
Sua intenção pode ser a melhor do mundo. Eu não vou seguir, pois já tenho meu arsenal farmacêutico receitado por um profissional. Mas obrigada por se importar comigo.

3 - Perdoe o meu mal humor. Não é (necessariamente) por querer.
Ninguém é feliz sentindo dor de cabeça, minha gente. Sorrir, dói. Tento ser educada, mas não mais que isso. Não consigo. Compreendam, por favor. Em alguns dias, volto a ser simpática, falante e sorridente, ok?



Grata.

PS: esse post deveria ter ido pro Facebook (e demais redes sociais onde pessoas que me conhecem e convivem comigo iriam ler). Mas minha página já está tão cheia de, digamos, "recados ríspidos" como esse, que preferi desabafar por aqui mesmo. Ninguém vai ler, mas já ganhei 10 minutos ignorando alguém que não seguiu as instruções acima. iêi!

sexta-feira, junho 3

Ironias da vida

Na pressão.
Todos os dias.
Sem parar.
Cessar, jamais.

Uma necessidade constante de que algo chegue ao fim.
Ansiedade que não permitiu ver a beleza do caminho.
Caminho que não era de passos, mas de trincheiras.

Sem saída. Sem alternativa.
Com toda esperança e certeza de que
Se não é pra cumprir, melhor nem prometer.
Chegar ao fim. Isso sim.

Até que um dia a guerra acaba.
A pressão se dissolveu em lágrimas.
As promessas agora não são mais do que um sonho realizado.
Erroneamente pode-se dizer que a vida foi vivida.

A verdadeira beleza começa a surgir
Quando não há caminho pra caminhar
A liberdade de ser escolhido
Pra esquecer.
Pra Sorrir.
E Viver.

A ironia é encontrar as mesmas pessoas que estavam com você nas trincheiras da vida.

[agora é tudo tão leve]



segunda-feira, setembro 21

Minha oração para hoje

Que atendas ao teu anseio de ser livre
Que as molduras da tua integração sejam suficientemente amplas para os sonhos da tua alma
Que te levantes todos os dias com uma voz de bênção murmurando em teu coração que algo de bom te vai acontecer
Que encontres uma harmonia entre a tua alma e a tua vida. 
Que a mansão da tua alma nunca se torne um local assombrado. 
Que reconheças o anseio eterno que vive no cerne do tempo
Que haja benevolência no teu olhar quando contemplares o teu íntimo. 
Que nunca coloques muros entre a luz e ti. 
Que o teu anjo te liberte das prisões da culpa, medo, decepção e desespero. 
Que permitas que a beleza espontânea do mundo invisível te recolha, cuide de ti e te inclua na integração.

quinta-feira, março 12

Me ignore

A manhã de hoje é atípica.
E isso me faz querer escrever sobre algo mais pessoal.


Há muito tempo, desde que eu me entendo por gente, descobri que eu era o ponto fora da curva. E nos anos 90 isso significava ser errada. Muito mesmo.
Então eu passei os últimos 20 anos tentando ser normal.
E consegui. Um pouco, pelo menos.

Daí eu eu descobri, que nos anos 2000 ser normal é pouco. A moda agora é ser você mesmo. Mas não pode copiar ninguém, senão fica feio.

De 2010 pra cá eu aprendi uma valiosa lição: ser quem você é não é igual a quem você quer ser.
Isso me causou um stress horroroso. Dias a fio em terapia. Sessões de filmes melosos e playlists variadas tentando dar a trilha sonora do meu drama particular. 

Ser normal é chato. E muito caro.

Bom, eu continuo o ponto fora da curva. Mas agora eu sei que a curva se move. Isso faz com que eu me mova também. Pra bem longe dessa linha pegajosa e sem graça.

Não quero mais ser igual a ninguém. E nem quero ser meu modelo mental. Dá muito trabalho. Cansei.

Passo meus dias fugindo da rotina que eu planejei pra mim. Sou a contradição em pessoa. Signo dragão com ascendente em cachorro, o signo oposto. Sou geminiana com ascendente em capricórnio, ou seja, um signo porra louca com um signo certinho. Às vezes sou. Às vezes não. 
A dualidade cansa. Ainda mais quando é tão intensa assim.

É difícil demais explicar o que se passa na minha mente.
Se Jennifer Lopez tivesse entrado na minha cabeça (como fez no filme "A Cela"), ela não saía viva. Certeza. Não ia encontrar o caminho de volta.

Eu posso justificar com um monte de coisas.
Mas isso seria dizer que meu jeito inconstante, porém rígido é errado. E eu descobri a pouco tempo que não tem nada de errado com isso.

Eu não sei fazer poesia. Mas procuro meus sentimentos naquilo que leio.
Alguém me disse que eu me expresso bem. Sei não.

No meu último teste de personalidade, me apontaram como ativista: charmosa, independente, energética e compassiva. Faço parte de 7% da população. Talvez isso explique muita coisa.

Eu realmente me importo com o que as pessoas pensam. Mas sou forte o bastante para ignorar algumas delas. Ou às vezes estou só distraída mesmo. Daí é mais fácil cair na desculpa social de "estou trabalhando-estudando-vivendo-minha-vida-sem-tempo-bora-marcar-de-se-ver-beijo-me-liga". Estamos programados nos justificar a todo tempo e pra aceitar isso numa boa.

Sim, eu sou desligada. Sempre chego atrasada. Presto atenção em detalhes que ninguém se importa (talvez só 7% da população ligue pras mesmas coisas que eu). Tenho pressa pra chegar em lugar nenhum.
Não sei seguir mapas. Sou intuitiva ao extremo. Não gosto de pessoas que reclamam o tempo todo.
Política me deixa com dor de cabeça. Rezo melhor quando falo em voz alta. Penso muito. Penso demais. Hã?

Ei, porque tô falando tudo isso mesmo? Eu devia estar estudando...

Pelos próximos 21 dias, vamos ver o que vai ser.

***


terça-feira, janeiro 27

Ansiedade

Eu não tenho o hábito de escrever no Quinta com uma frequência regular. Mas sempre quando tenho vontade de escrever sobre alguma coisa muito importante ou significativa pra mim, eu venho é pra cá mesmo.

E se tem uma coisa que tem me consumido pelos últimos 20 e poucos anos é ela: a ansiedade.


Tocar nesse assunto é um tanto delicado porque me faz parecer doida.

O que é?
Ansiedade nada mais é do que a excitação do Sistema Nervoso Central em momentos de perigo (real ou imaginário) que causam sensações desagradáveis no restante do corpo que variam de pessoa para pessoa (ex.: taquicardia, sudorese, boca seca, tensão muscular, tremedeira, confusão, vertigem, ânsia de vômito, dificuldade para engolir ou respirar, dificuldade para relaxar ou dormir, dor de cabeça, fome incessante, dentre outros).

Eu tenho isso?
A ansiedade é uma caraterística normal em todo ser humano, pois todos vivemos momentos de perigo. Não mais como no tempo das cavernas, mas situações como uma entrevista de emprego, realizar uma prova, uma grande viagem ou uma crise financeira são consideradas como momentos de perigo na nossa atualidade.


Vantagens
Não existe um mal que não traga um bem, como diria minha linda avó. A ansiedade tem um papel fundamental na sobrevivência da espécie humana. Isso porque é graças a essa excitação no sistema nervoso que a pessoa se dá conta que está em uma situação de risco e consegue se preparar para superar o desafio ou se adaptar à nova condição de vida.

Desvantagens
O problema começa quando essas sensações ficam fora de controle. Se a coisa fica feia mesmo, a pessoa pode desenvolver algum tipo de transtorno, como um Transtorno de Ansiedade Generalizada, Transtorno Obsessivo Compulsivo, Transtorno Hipocondríaco, Síndrome do Pânico, dentre outros.


Como identificar?
Ansiedade surge em momentos de perigo. Como eu disse, o perigo pode ser real ou imaginado pela pessoa. Isso significa que em algum momento da vida, todos já sentimos sensações como as que eu descrevi ali em cima (tremedeira, boca seca, taquicardia, vertigem, e por aí vai).
Se isso for recorrente, preste atenção (hipocondríacos, nem tanto). O primeiro passo é se observar para saber se essas sensações parecem em um momento de perigo real. Se você está na dúvida, procure ajuda. Sempre.

Como tratar?
Se você estiver num nível de ansiedade muito alto, sugiro que procure um psicólogo. A terapia pode ajudar caso você esteja passando por um momento em que realmente seja difícil lidar com a ansiedade, o que pode acabar te atrapalhando mais do que ajudando.
Outro profissional de saúde indicado para o tratamento da ansiedade é o psiquiatra. Ele pode prescrever remédios que podem ajudar no controle da ansiedade.

Tomar remédio ajuda?
Se seu objetivo for se tratar, ajuda sim. 
Se sua ideia de "ajuda" for tomar remédio pro resto da vida, sorte do seu farmaceuta que vai ficar rico às suas custas (porque remédio pra ansiedade é um absurdo de caro!).
De qualquer forma, tomar remédio por conta própria é muito arriscado, pois as necessidades de cada um são diferentes. E as reações também. É sempre bom contar com um bom profissional que possa lhe acompanhar, até mesmo para adaptar as doses, prescrever a melhor substância para o seu caso específico ou mesmo suspender a medicação quando ela não for mais necessária.

Substâncias naturais ajudam?
Sempre! Afinal, de onde você acha que saem os remédios? Existem no mercado uma série de produtos para aliviar tensão e ansiedade. Procure produtos com lavanda\alfazema (sim, são a mesma coisa) e camomila. 

Dicas infalíveis
Vivemos no caos. Desde sempre. O mundo tende ao caos, já prestou atenção nisso?
E aí, como conviver com a ansiedade desse jeito?

* Dicas básicas que servem pra qualquer pessoa:
- tenha uma alimentação saudável;
- faça exercício físico regularmente;
- tenha seu momento de lazer;
>> isso já é difícil pra caramba de fazer!

* Procure seu equilíbrio mental:
- Respire fundo. Atividades como yoga, dança ou canto, focadas na respiração adequada, ajudam bastante.
- Aceite a situação como ela é. Não torne o problema maior do que ele realmente é. Não piore a sua situação.
- Cerque-se de pessoas que te amam. Pessoas para criticar e atrapalhar só pioram a ansiedade.
- Desacelere a sua mente. Aquele turbilhão de pensamentos não vão te ajudar a superar seus desafios;
- Tenha calma com você mesmo. Conviver com a ansiedade é um aprendizado diário. 


Eu estou passando por esse aprendizado diário. Às vezes esqueço de como a vida é simples e a gente consegue complicar tanto. Vou tentar seguir as dicas que eu postei aqui. Quem sabe não consigo superar minha ansiedade dessa vez?